Aquele copo de cerveja
Saudades, meu bem, daquele seu copo de cerveja. Daquele que sempre manchava minha cômoda. Saudades de reclamar com você e de me lembrar, sempre que via as marcas circulares na madeira, da sua cara mais lavada do mundo de quem se arrepende de mentira. Agora sento no sofá e lembro das nossas brigas bobas. A casa parece tão vazia. Não tem ninguém mais pra me buscar um copo d'água e fumar comigo um cigarro mentolado na varanda. Deito às vezes no chão e me dou o prazer dessa saudade doída e gostosa por dez minutos. Apenas por dez minutos me deixo engolfar por essa sensação estranha dos passados e dos amores perdidos. Pisco e tudo parece que passou num instante. Parece aos meus olhos que seu copo suado de cerveja ainda molha meus móveis e que seu corpo molhado de suor ainda embala minhas noites de verão. A questão é que a vida talvez pareça mais bonita pelos olhos da melancolia. Ah, a melancolia! A transformadora dos passados mais sórdidos nos retratos mais bonitos. Acho que sim. Pros esfomeados, a grama do vizinho sempre parece mais verde. Mesmo que esse vizinho seja você mesmo num passado não tão distante.
Um comentário:
" A questão é que a vida talvez pareça mais bonita pelos olhos da melancolia. Ah, a melancolia! A transformadora dos passados mais sórdidos nos retratos mais bonitos."
"Pros esfomeados, a grama do vizinho sempre parece mais verde. Mesmo que esse vizinho seja você mesmo num passado não tão distante."
Não sei se seus textos também parecem mais bonitos pelos olhos da melancolia, mas é fato que esse foi um dos seus escritos solitários dos quais eu mais gostei até hoje! Maravilhoso texto, linda escolha de palavras, e um retrato muito vívido de algo triste, porém descrito belamente.
:)
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